domingo, setembro 02, 2018

Tirando todas as dúvidas sobre o "kit gay"


Muito ouvi falar, essa semana toda, sobre a polêmica levantada por Bolsonaro com o livreto "Aparelho Sexual e Cia" e o famoso "kit gay". Afinal, o "kit gay" existiu mesmo? E o tal livro fazia parte deste kit? O kit chegou a ser distribuído? Essas e outras perguntas que me fizeram nas redes sociais respondo abaixo,após longa pesqusia. Todas as respostas estão acompanhadas de fontes, caso queiram checar a veracidade das informações.

1) Aconteceu mesmo um seminário LGBT no Congresso, com enfoque ao público infantil?
Sim. Aconteceu nos dias 15 e 16 de maio de 2012, no Plenário 9 da Câmara dos Deputados, o 9º Seminário LGBT (era a nona edição, mas a primeira acontecendo no Congresso) cujo tema daquele ano seria: "Infância e Sexualidade", conforme mostram os links abaixo.
Fontes: Câmara dos Deputados e Blog do deputado Jean Wyllys

2) E existiu mesmo um "kit gay"?
Sim, mas não com este nome. Este foi o nome dado pela bancada conservadora da Câmara e que se popularizou devido à ampla repercussão na mídia. Na proposta do MEC o kit se chamava "Escola Sem Homofobia" e a ideia era distribuí-lo nas escolas públicas. No kit continha:

a) O Caderno Escola sem Homofobia, destinado a profissionais da área educacional;

b) Os Boleshs (Boletins Escola sem Homofobia), com 6 bolletins que seriam distribuídos aos estudantes. Cada número trabalharia um tema importante na área dos direitos da população LGBT (o que é ser mulher e o que é ser homem; orientação sexual; diversidade sexual; homofobia; direitos; relações familiares).
O material não possui classificação indicativa. Diz apenas que é “essencial para a formação do espírito crítico em adolescentes e jovens estudantes”.

c) Material audiovisual com os seguintes títulos, abordagens e classificação indicativa:
- "Boneca na Mochila": baseado em história verídica, mostra um motorista de táxi que conduz uma mulher aflita chamada a comparecer à escola onde seu filho estuda, apenas porque o flagraram com uma boneca na mochila. Classificação indicativa: não recomendado para menores de dez anos.
- "Torpedo": material audiovisual com 3 histórias. A primeira, que dá título ao vídeo, trata-se de uma animação com fotos, que apresenta questões sobre a lesbianidade através da história do início do namoro entre duas garotas que estudam na mesma escola: Ana Paula e Vanessa.
A segunda, é "Encontrando Bianca" que, por meio de uma narrativa ficcional em primeira pessoa, num tom confessional e sem autocomiseração, como num diário íntimo, José Ricardo/Bianca revela a descoberta e a busca de sua identidade de travesti.
A terceita chama-se "Probabilidade" e trata da descoberta da bissexualidade de um garoto adolescente.
A classificação deste material contendo as 3 histórias é: LIVRE.

Fontes: G1 - 21/01/2016 e ONG Ação Educativa

3) O tal livreto "Aparelho Sexual e Cia" estava ou não no chamado "kit gay"?
Não. O tal livreto fazia parte de outra proposta, dentro do mesmo seminário, que envolvia o MinC e não o MEC.

Fontes: G1 - 21/01/2016

4) Então o que seria feito com o livreto?
O livreto que Bolsonaro mostrou, fazia parte da proposta LGBT que envolvia o MinC (Ministério da Cultura), e seria distribuído nas bibliotecas públicas.
Fonte: G1

5) Mas eu soube que só foram comprados 28 exemplares deste livreto. É verdade?
Sim. Foram comprados 28 exemplares em 2011, antes do seminário acontecer, imagino que para servir de material de apresentação no evento (parece que Bolsonaro conseguiu pegar um pra ele). Como a ideia era distribuir às bibliotecas, subentende-se que a pasta iria adquirir mais exemplares. No entanto, como a proposta foi barrada, só ficaram nesses 28 mesmo.

(Mesma fonte do item 3)

6) Mas como há relatos de distribuição do livreto em escolas públicas no interior de São Paulo, MG e até RJ?
Na verdade, as denúncias da distribuição de alguns kits, cartilhas LGBT (não só nesses estados, mas também no Norte e Nordeste) e até livretos similares (com conteúdo sexual mais explícito, inclusive) ao que Bolsonaro mostrou, se deram por outros motivos que já, já explico. O caso é que o livreto mostrado no JN não foi enviado às escolas. No entanto (e isto não sei explicar, já que o MinC afirma que só comprou 28 exemplares), vários livretos foram encontrados em bibliotecas públicas infanti (conforme mostra foto abaixo com carimbo da Biblioteca Infantil Municipal Monteiro Lobato, de Araraquara - SP). Pode ser que essas bibliotecas tenham comprado por conta própria ou recebido doação. (Não sei dizer).

Os demais materiais encontrados em escolas foram distribuídos à revelia do MEC e da Secretaria de Educação de suas respectivas cidades. Como chegaram lá? Encontrei algumas matérias que respondem:
- Uma parte foi desviado do material educativo da pasta da Saúde, com conteúdo de combate à homofobia, a 13 estados das regiões Norte e Nordeste. Foi aberto, em 2013, um processo administrativo pelo então ministro da Saúde, Alexandre Padilha, para identificar os responsáveis pelo envio de um material educativo, elaboradas em 2010, como parte do programa de prevenção de doenças sexualmente transmissíveis (DST) e Aids e, que foi remetido às Secretarias de Saúde nos estados. Mas não sei como ficou o caso, já que não achei mais nada referente a este assunto.
 (Fonte: O Globo - 07/03/2013)

- Outra parte, pode ter sido desviado do próprio kit do MEC, que foi vetado, mas que, ainda assim foi adquirido indevidamente pela pasta, dando um prejuízo de R$ 800 mil aos cofres públicos. O TCU (Tribunal de Contas da União) cobrou explicações do MEC (Ministério da Educação), já que o valor foi gasto com a produção do material antes que a presidente sancionasse o programa. O MEC (cujo ministro na época era Fernando Haddad) chegou a afirmar que o material estava guardado e poderia ser usado pelo ministério, mas a explicação não convenceu o tribunal.
(Fonte: Jornal Folha de São Paulo)

- E ainda existe a possibilidade das próprias escolas, de forma independente, em parceria com grupos LGBTs terem adquirido material similar e distribuído sem autorização de ninguém, nem do MEC, nem das Secretarias e nem dos pais. (suposição minha).

7) E, afinal, o livreto que Bolsonaro mostrou, era direcionado ao público infantil, na faixa de 6 anos de idade?

Segundo a editora, Companhia das letras, a indicação do livro, quando em catálogo, era para “o 6º, 7º, 8º e 9º anos do Ensino Fundamental, ou seja, para alunos de 11 a 15 anos".
Fonte: Estadão

Resumindo: O livreto estava na proposta do MinC, e não do MEC, e seria destinado a bibliotecas. Já o "kit gay" do MEC seria destinado a escolas, e o material, segundo o documento da própria proposta, seria destinado a um público variado, com classificação diversa, com um deles estando classificado como "Livre".

Ficou alguma dúvida? Caso sim, diga no comentário que vamos tentar achar a resposta.

4 comentários:

  1. Até onde sei, nenhuma dúvida até o momento. Bela pesquisa! Obrigado pela informação. Vou compartilhar com os devidos créditos.

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  2. Vc é danada. Na vdd uma excelente jornalista e pesquisadora. Vc falou sobre isto ontem comigo. Dúvidas tiradas ontem e hoje ainda de forma didática. Independente dos candidatos precisamos saber dos fatos reais e tirarmos a nossa conclusão

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    1. Essa foi minha intenção: publicar os fatos e deixar que cada um tire as próprias conclusões. Sem defender ou acusar ninguém.

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